Para muita gente, a greve dos Correios, que já dura três
semanas, têm se transformado em uma dor de cabeça, com atraso nas entregas de
documentos e encomendas feitas por e-commerce, cuja procura aumentou na
pandemia.“Os Correios já eram vistos como um serviço ineficiente e caro pela
população antes da crise do coronavírus”, diz Eduardo Mello, professor de
ciências políticas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo. “Em plena
pandemia, com mais gente comprando pela internet, essa greve deve reforçar a
ideia que o setor precisa de concorrência, dando um gás novo à ideia da
privatização”.
A greve não tem prazo para terminar, segundo a Federação
Nacional dos Trabalhadores em Empresas dos Correios e Similares (Fentec). Não
há muita esperança que seja obtido um acordo na audiência de conciliação
marcada para esta sexta-feira, 11, no Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Cerca de 70% da categoria está parada. A principal demanda da categoria é a
continuidade do acordo coletivo firmado em 2019 com a empresa, que foi suspenso
em razão da pandemia. Os trabalhadores também são contra a privatização da
empresa.
José Rivaldo da Silva, presidente da Fentec, disse que o
“governo busca a qualquer custo vender um dos grandes patrimônios dos
brasileiros, os Correios” e que a empresa “pretende suprimir direitos dos
trabalhadores”. Mesmo assim, a privatização começa a dar os primeiros sinais de
que deve sair da letargia.
O projeto de lei que estabelece o novo marco legal para o
setor postal deve ser encaminhado para o Congresso nas próximas semanas,
segundo o Ministério da Economia. O envio da medida é o primeiro passo para o
processo de privatização dos Correios. “Vai ser uma queda de braço, porque de
um lado a população parece ser favorável à empreitada, assim como os milhares
de e-commerces que dependem das entregas, mas de outro lado há interesse em
manter o monopólio da estatal”, diz Mello.
Trabalham nos Correios atualmente mais de 105 000 pessoas.
Nos cargos mais altos, os salários chegam facilmente a 50 000 reais, segundo
fontes ligadas à estatal. E as denúncias de corrupção continuam. Este ano, no
início de agosto, a Polícia Federal lançou a segunda fase da Operação Postal
II, que apura indícios de fraudes de 94 milhões de reais na estatal. Em 2005, a
empresa esteve no centro do escândalo do mensalão.
Os desvios de recursos e dificuldades operacionais da
empresa, no entanto, não sustentaram o discurso de privatização da companhia
até este momento. Anunciado como uma das bandeiras do presidente Jair
Bolsonaro, o processo pouco andou desde o ano passado. Salim Mattar,
ex-secretário de Desestatização do Ministério da Economia, deixou o governo
dizendo que sofreu críticas de algumas alas do governo e de funcionários das
estatais que estão na mira das privatizações, como os Correios.
“Nenhuma empresa privada vai se interessar em fazer o serviço
que a estatal faz hoje, de entregar cartas nas cidades pequenas, e o governo vai
entregar uma empresa estratégica para os estrangeiros”, diz José Rivaldo da
Silva, presidente da Fentec.
O embate continua. “O governo está trabalhando na finalização
do projeto de lei para encaminhar ao Congresso a regulamentação de como o
serviço pode vir a ser prestado por um parceiro privado, como garantir a
universalização e a modicidade das tarifas”, disse a secretária especial do
programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do Ministério da Economia, Martha
Seillier, em um evento realizado com investidores no dia 18 de agosto. Com a
greve prolongada da categoria, o debate em relação à privatização do serviço
pode sair fortalecido.
Fonte: Exame.com