Essa esperança aquece nossos corações e percorre em nossas veias o sangue fervente latino-americano, apaixonado pelo esporte. Mas, ao mesmo tempo, desce em lágrimas, tristezas e frustrações quando nos deparamos com as marcas da desigualdade. O que dói é perceber o quanto ainda somos desiguais — e, pior, como fechamos os olhos para não enxergar essa gritante separação social.
Confesso que choro por dentro, e às vezes preciso enxugar as lágrimas quando vejo crianças jogando de pés descalços, enquanto outras ostentam tênis de marca — um retrato cruel da desigualdade entre escolas. Uniformes desiguais, tamanhos errados — calçados grandes demais, sapatos número 35 em pés 33 — mostram que, embora existam profissionais dedicados, famílias empenhadas, diretores, professores e amigos, as navalhas afiadas da desigualdade continuam cortando fundo entre bairros, escolas, cores, raças e gêneros.
Confesso também que, muitas vezes, identifiquei as escolas públicas e particulares não pelas cores dos uniformes nem pelos talentos individuais ou coletivos, mas pela cor da pele de seus alunos. Não sei se isso me torna preconceituoso, mas é a minha verdade: foi assim que muitas vezes percebi as diferenças — entre oásis e deserto social, entre escolas como Pitágoras, Ação, Polivalente, Horácio Pires, Francisco Bastos, CRON, e tantas outras.
Por isso, faço um apelo: vamos sentar, conversar e olhar criticamente para essa realidade. Senhoras e senhores, independentemente de cor, raça, gênero, condição financeira, ideologia política — não podemos fechar os olhos enquanto algumas crianças jogam descalças e outras exibem marcas mundialmente reconhecidas nos pés.
Faço aqui um desafio simbólico: que nós, pais e mães de alunos de escolas particulares, quando virmos colegas jogando descalços, tiremos também nossos tênis — em solidariedade e respeito. Que o exemplo venha do gesto, não do discurso.
Fico empolgado com os talentos das nossas crianças, mas também profundamente cortado por dentro, envergonhado ao ver divisões nas torcidas — “lados R e P”, — como se estivéssemos em campos opostos de um mesmo jogo social.
Não sei quem são os vencedores ou os perdedores desse processo. Não sei de quem é a culpa. Mas sei que sou parte do problema, e por isso quero ser também parte da solução.
Desejo, a cada ano, ver diminuir essas diferenças. Conclamo o poder público, o setor privado e a sociedade civil para que, juntos, possamos reduzir os quilômetros de distância social que se revelam nos Jogos Estudantis. Que possamos, enfim, enxergar apenas os talentos que alegram nossos corações e fazem brilhar nossos olhos.
Senhores agentes públicos, há muitas formas de buscar recursos para esse fim. Quero me somar a vossas excelências, nas diversas instâncias, para lutar contra quem lucra com a fragilidade social — e que os mesmos recursos retornem, por meio de impostos e políticas públicas, para a valorização da igualdade nos Jogos Estudantis.
Quero empunhar minha espada de ideias, cuspir fogo de vontade, calçar as sandálias da solidariedade e defender a igualdade social, assim como vejo tantos talentos defendendo bolas nas quadras e nos gramados.
Que a calça curta da desigualdade seja substituída pelo uniforme justo da dignidade".
Fabian é calmonense, engenheiro agrônomo.
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